25 janeiro 2014

Quem disse isto, sobre I&D em Portugal, em 2011?

Entre meados da década de 80 e da década de 90, há uma altura em que o esforço para o desenvolvimento da ciência começa a ser interessante, mas as ciências sociais e as humanidades são completamente desprezadas. O que se pensa na altura é que o que é preciso fazer é criar riqueza, com ciências exactas, com engenharias e outras disciplinas afins. E a gestão, evidentemente, muito na moda. Depois, começa a haver clamor e discussão, aqui e acolá. A partir de certa altura, fez-se uma rectificação. As políticas científicas do Estado e das autoridades começam a olhar para as ciências sociais e para as humanidades (até para as artes) com outros olhos. Talvez durante dez anos ou quinze anos, tenha havido um reequilíbrio. Imagino que você já deva ter entrado nesse período. Começaram a aparecer instituições com alguns meios, com recursos, com projectos financiados e pós-docs e bolsas de doutoramento em maior quantidade. Ao que parece agora, os primeiros golpes de austeridade e de contracção vão ser sobre as humanidades e sobre as ciências sociais, na medida em que se pensa, uma vez mais, que só as outras ciências é que criam riqueza, só as outras ciências é que desenvolvem. Isso é um erro clássico. É sabido e reconhecido que as humanidades e as ciências sociais contribuem para o desenvolvimento. E muito. Incluindo para a criação de riqueza. As humanidades e as ciências sociais não se limitam ao fabrico de professores. O pensamento social ajuda ao desenvolvimento e à criação de riqueza.

Há outro problema que gostaria de mencionar. Houve um lado positivo na política científica das últimas duas décadas. Esse lado positivo é o enorme esforço financeiro, estrutural e político que foi feito a favor da ciência, do desenvolvimento da ciência, da graduação no estrangeiro, da internacionalização, etc. Isso é um lado muito positivo. Que conseguiu uma razoável equiparação das ciências sociais e humanas às ciências exactas. O lado negativo foi a criação de um aparelho ou um dispositivo para a investigação científica que não contagia a universidade. Ou contagia pouco. Ou mal. Os Laboratórios, os Centros de Investigação da FCT ou centros de excelência constituem um método de trabalho. Esses centros têm mais dinheiro, mais garantias e mais segurança; têm mais regras de avaliação, mais critérios e melhores métodos de escrutínio. Têm tudo mais e melhor, mas não dependem da universidade. Fala-se com um reitor ou com um director de Faculdade, que tenha três ou quatro mil alunos e ele vai demonstrar-lhe muito rapidamente que não tem qualquer capacidade de ordenar ou de orientar a investigação científica. “Isso é com a FCT e com o Ministério”. Foi criado uma espécie de ghetto, com mais recursos, mais exigência, inclusive coisas boas como a avaliação externa. Durante anos, nada disto se praticou no ensino, mas sim na ciência. Pessoalmente, preferia que a ciência fosse entregue às universidades, para que esta tivesse influência no ensino.

Entrevista aqui.