Culturas, economia e política, tecnologia e impactos sociais, media, contaminantes sociais, coisas estranhas... Cultures, economy and politics, technology and social impacts, media, social contamination, weird stuff...
24 outubro 2007
Crédito na farmácia
ou Leis da treta, como sintetiza o Blasfémias: "Segundo o DN, alguém do INFARMED terá declarado que «face à lei actualmente em vigor não é permitida» a venda de medicamentos a crédito. Sabendo que a associação nacional de farmácias tem planos para criar um cartão de crédito (em associação com um banco público), será que algum dos leitores é capaz de identificar (número e data) a dita lei?
Se existir mesmo uma lei com tal proibição, não deixa de ser curioso que o Estado proíba aos cidadãos aquilo que ele próprio faz por sistema: pagar os medicamentos a crédito".
Algumas notas sobre o assunto: esta história apareceu anteontem - se não estou em erro - na Sic e nela era explicada que a lei que proíbe a venda a crédito nas farmácias data de 1968 (não é erro). Presumo que seja este Decreto-Lei nº 48547, de 27 de Agosto de 1968 que "Regulamenta o Exercício da Actividade Farmacêutica".
Os valores das vacinas (são duas de diferentes marcas farmacêuticas) chegam quase aos 400 euros porque são necessárias várias doses (ver).
A notícia do DN (e outras que a citaram) mistura o que a farmácia está a fazer: a uns vende a preço de compra e, em paralelo e segundo o que foi explicado, aliou-se a uma empresa de crédito para quem precisa de adquirir as doses e não tem dinheiro.
Qual o problema? Pouco percebo de farmácias e nem sei sequer se a lei já foi revogada ou acrescentada mas, segundo o tal DL 48547 (Artigo 36.º), o farmacêutico não pode angariar clientela através da "concessão de descontos, comissões, benefícios ou bónus sobre os preços dos medicamentos oficialmente marcados ou a atribuição de dádivas tendentes a conceder uma vantagem ao cliente, quando não sejam permitidas pelos regulamentos em vigor sobre o respectivo comércio ou estabelecidas" por acordos.
No artigo 38.º, esclarece-se ainda que "são proibidas todas as formas de agenciamento de clientes, bem como o fornecimento de medicamentos ao público por interposta pessoa que tenha intuitos lucrativos".
Se é isto que está em causa, então nem a farmácia pode oferecer descontos nem os clientes podem recorrer a empresas de crédito - de forma explícita, pelo menos.
Sobre o crédito em farmácia, é curioso ver duas decisões em 1999 da Comissão Nacional de Protecção de Dados.
A primeira mostra que a Associação Nacional de Farmácias pretendia legalizar o seu "novo sistema de informações da farmácia" SIFARMA 2000, incorporando alguns "dados bancários (número de cartão de crédito)".
A segunda mostra como uma farmácia pedia "a legalização do seu ficheiro de gestão de crédito de utentes".
Em resumo, ou este caso da farmácia do Porto está a servir para fins insondáveis ou isto tudo é uma grande treta.
[act. por Carlos Loureiro: "É provável que o INFARMED se estivesse a referir ao decreto-Lei de 1968 que indica, ainda que, a meu ver, a alínea que fala da "interposta pessoa" não se aplicasse ao caso, já que o financiador não surge como intermediário na venda, que era o que estava em causa na norma, a julgar pelo n.º 2 que excepciona os "recoveiros". Acontece que aquele Decreto-lei 48547 foi integralmente revogado recentemente pelo DL 307/2007, de 31 de Agosto (cf. art.º 60.º, n.º 1, al b). Apesar de este diploma só entrar em vigor vigor no final deste mês, a parte respeitante à comercialização de medicamentos constante do DL 48547 já tinha sido revogada em 2005, pelo DL 134/2005 de 16 de Agosto. Por isso, a dúvida que suscitei no meu post: "qual a lei que proíbe a venda de medicamentos a crédito?" mantém-se."
Dos comentários no Blasfémias: "Talvez os senhores que moram na Quinta da Marinha ou em condominios fechados não saibam, mas eu explico. (nasci e morei em Chelas até À idade adulta).
Se as farmácias não vendessem a crédito, muira gente, sobretudo idosos não teria possibilidades de comprar os medicamentos necessários a uma qualidade de vida aceitável. As receitas do SNS têm uma validade de 18 dias e este prazo às vezes não
é suficiente para "arranjar disponibilidades". Assim, e pelo menos até ao próximo recebimento da magra reforma, na farmácia do bairro
"fica-se a dever". Também e se a conta excede o esforço possivel, pode-se "dar metade" ficando o resto em divida até ao próximo recebimento. Isto é corrente, toda a gente sabe e muito gente sobrevive assim. É ilegal? não sei. É pelo menos imoral que as pessoas estejam dependentes do boa vontade do proprietário da farmácia para sobreviver. E o governo, O SNS, não sabem? Claro que sabem deve ser por isso que diminuiram as comparticipações de vários medicamentos..." io | 24.10.07 - 4:28 pm]