É, realmente, um "problema muito interessante".
António Barreto escreveu sobre Sócrates e a liberdade há um ano. Dizia então:
"Foram tomadas medidas e decisões que limitam injustificadamente a liberdade dos indivíduos. A expressão de opiniões e de crenças está hoje mais limitada do que há dez anos. A vigilância do Estado sobre os cidadãos é colossal e reforça-se. A acumulação, nas mãos do Estado, de informações sobre as pessoas e a vida privada cresce e organiza-se. O registo e o exame dos telefonemas, da correspondência e da navegação na Internet são legais e ilimitados. Por causa do fisco, do controlo pessoal e das despesas com a saúde, condiciona-se a vida de toda a população e tornam-se obrigatórios padrões de comportamento individual."
E prosseguia:
"A nova lei de controlo do tráfego telefónico permite escutar e guardar os dados técnicos (origem e destino) de todos os telefonemas durante pelo menos um ano. Os novos modelos de bilhete de identidade e de carta de condução, com acumulação de dados pessoais e registos históricos, são meios intrusivos. A videovigilância, sem limites de situações, de espaços e de tempo, é um claro abuso. A repressão e as represálias exercidas sobre funcionários são já publicamente conhecidas e geralmente temidas. A politização dos serviços de informação e a sua dependência directa da Presidência do Conselho de Ministros revela as intenções e os apetites do Primeiro-ministro."
Barreto afirmava ainda:
"NÃO SEI SE SÓCRATES É FASCISTA. Não me parece, mas, sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu governo. O Primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas".
O texto, escrito no Público de 6 de Janeiro de 2008, dizia finalmente:
"TEMOS DE RECONHECER: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo..."
Sem medo, Fátima Rolo Duarte (FRD) respondeu passado um ano, acusando Barreto de ser "o mesmo que se serve de um contador de hits e tráfego, que controla o IP de quem o visita, hora a hora, minuto a minuto? Um contador invisível a olho nu e apenas disponível no view source deste blog?!"
Um dos responsáveis pelo Sorumbático explicou que o comentário de FRD era "completamente descabido por um motivo muito simples: Quando [Barreto] entrou para este blogue, já o 'site-meter' existia há muito (e até já houve outros)" mas resolveu "premiar o melhor comentário".
Alguns humoristas não fariam melhor, tanto mais que Barreto insiste num outro texto recente (Gostaria..., no Jacarandá e Público de 28 de Dezembro de 2008) que "Gostaria que o governo, num sobressalto de consciência e de preocupação com as liberdades públicas e os direitos fundamentais do cidadão, reconsiderasse todas as medidas e procedimentos em curso que consolidam um clima de intrusão, de violação da privacidade, de despotismo e de controlo dos cidadãos, incluindo, evidentemente, o bilhete de identidade múltiplo, o chip dos automóveis, a legislação sobre escutas telefónicas, a actuação da ASAE e a delação fiscal e económica".
Três pequenas notas sobre todo este assunto:
1) Barreto não sabe do que fala quando fala da retenção de dados (não há escutas);
2) FRD não sabe do que fala quando aborda o registo de IP em contadores de blogues, esquecendo que podem ser disfarçados ou usados por variadas pessoas a partir de um mesmo computador;
3) pelas suas demonstradas sensibilidades, gostava de ver estas pessoas envolvidas numa entidade pública preocupada com a privacidade electrónica. Chama-se cidadania, não era?...