26 julho 2009

Terão as notícias algum valor?

Vários orgãos de comunicação social anunciaram nos últimos meses algum interesse em adoptar modelos de pagamento de conteúdos no online, uma alteração drástica no panorama estrutural dos media.

No início de Maio, responsáveis do MediaNews Group (mais de 50 diários nos EUA) reconheceram a “injustiça” de “criar a percepção de que o nosso conteúdo não tem valor” ao disponibilizá-lo gratuitamente online. Agora, tencionam “começar a afastar-se” dessa estratégia, mostrar o “valor real” das notícias e demonstrar ao leitor que “o jornal é um produto, impresso ou online, que se tem de pagar”.

A inversão da gratuitidade online para o pagamento relaciona-se com a conjuntura económica e com a premissa da publicidade sustentar a imprensa online. Ora o investimento dos anunciantes na Web cresceu de 1500 milhões para 3200 milhões de dólares entre 2004 e 2007 mas essa tendência positiva desapareceu no ano passado, segundo a Newspaper Association of America.

Entre soluções técnicas para vigiar por onde andam os conteúdos na Web (que pode nem ser errada mas não é lançada com a melhor estratégia), com a indefinição do direito de autor online em blogues e agregadores, o mercado publicitário online saltita entre opiniões com uma quase certeza: com o jornalismo ou o negócio dos media, também a publicidade online tem de ser mais criativa para cativar os utilizadores e as empresas.

No cenário actual, “o impacto da Internet, exacerbado pelo marasmo na publicidade, está a matar o jornal diário”, como referia uma recente edição da revista Economist.

No espaço de um ano, até Março passado, 23 dos maiores 25 diários nos EUA perderam leitores. As excepções foram o Wall Street Journal (WSJ) e o Denver Post. Este beneficiou do fecho do concorrente local, enquanto o diário financeiro acompanhou o bem estar do Financial Times, com mais de 100 mil assinantes pagos no online, ao contrário do que sucedeu no papel após um aumento do preço de capa.

O WSJ.com tem mais de um milhão de assinantes e o triplo nos acessos (apesar da necessária cautela com estas estimativas: exemplos 1 e 2) mas procura novos modelos. Pode integrar numa mesma conta, mas de valor mais substancial, o acesso a diferentes equipamentos (como telemóveis do tipo iPhone e leitores electrónicos como o Kindle) ou avançar para micropagamentos no Outono.

Nessa altura, prevê-se o aparecimento do Journalism Online, agregador com assinatura por quantidade de artigos (seguindo o modelo da TV por cabo) ou micropagamento por artigo. Este sistema tem algumas vantagens mas pode ser criticado pela relação directa entre pagamento e conteúdo: permite determinar facilmente quais as notícias que os leitores preferem e os jornalistas mais lucrativos.

Rupert Murdoch, presidente da News Corp., assegurou também que terá conteúdos pagos nos próximos 12 meses noutras marcas fortes, a par com o WSJ. Também o New York Times - provavelmente o jornal com mais visão para o futuro online, com resultados razoáveis apesar das contrariedades do mercado - abordou publicamente modelos de assinatura ou para o leitor navegar por conteúdos gratuitos até que, após a leitura de um certo número de páginas no site, as restantes são cobradas.

A dificuldade tecnológica deste sistema é grande mas, pelo menos, os meios estão a apostar em experiências (adaptando-se com sucesso aos novos gadgets) sabendo que até podem não dar retorno financeiro volumoso ou imediato, segundo a PricewaterhouseCoopers em “Moving into Multiple Business Models”.

O estudo da PwC envolveu 4900 consumidores europeus e americanos e revela que muitos estão dispostos a pagar pelos conteúdos online (nomeadamente financeiros e desportivos). Esses gastos vão aumentar nos próximos anos e alterar a perspectiva dos que “esperam ter tudo gratuito” - mas só se não existirem ofertas equivalentes grátis.

Essa foi a razão porque 22% de utilizadores da Internet nos EUA cancelou a sua assinatura de jornais ou revistas em papel, segundo um inquérito do Center for the Digital Future.

No entanto, “apesar do enorme potencial de crescimento online, o papel continua[rá] a ser a maior fonte de receitas” dos jornais, salienta a PwC.

Há vários exemplos recentes de como os jornais tentam fazer crescer o seu negócio empresarial e/ou aumentar as vendas - mesmo que temporariamente - mas um em Inglaterra mostrou como a qualidade dos conteúdos, das reportagens, pode fazer a diferença.

Num país onde fecharam 80 jornais desde o início de 2008, o Daily Telegraph revelou o escândalo das despesas abusivas dos parlamentares, estabeleceu uma equipa de 25 jornalistas para tratar do tema, divulgou novas revelações e conseguiu somar diariamente centenas de milhar às habituais vendas de 800 mil exemplares.

Estas movimentações e estratégia dos meios impressos para o online deverá ser acompanhada atentamente pela comunicação social em geral, incluindo as televisões. Aliás, quando se fala de crise, são os jornais que assumem as fragilidades mas as cadeias televisivas, que pouco abordam este assunto, estão igualmente a atravessar uma forte recessão .

Não estão muito interessadas em falar sobre os problemas das televisões”, assegurou Michael Carpini, da Annenberg School of Communication, co-autor de um recente trabalho sobre estas diferenças (“Print covers its own woes, TV does not”), divulgado em Maio.

Numa análise a 26 jornais entre 2000 e 2009, foram contabilizados 900 artigos sobre quebras nas tiragens e 95 sobre perdas de audiências televisivas. Nas referências noticiosas das oito principais estações, baixaram para apenas 38 e seis, respectivamente.

Isto sucede quando perdem audiências mais rapidamente do que os jornais. No prime time, as televisões passaram de 32 milhões em 2000 para 23 milhões, segundo o New York Times. No mesmo período, a venda das edições diárias caiu de 56 milhões para 47 milhões.

Por tudo isto, a evolução dos media para cobrarem pelos conteúdos online permitirá clarificar se as notícias ainda têm algum valor económico pelo qual as pessoas estão dispostas a pagar ou se, pelo contrário, se banalizaram e desvalorizaram para quase zero. Qualquer que seja a resposta, será "uma alteração drástica no panorama estrutural dos media".