30 agosto 2006

VITAMEDIAS

Fui criticado e ligado (a ler também os comentários) por escrever que Eduardo Cintra Torres (ECT) fez um "desmentido" no domingo ao seu texto original sobre a RTP (texto e sequências aqui).

Nada de mais incorrecto: a citação é de Vital Moreira (VM) no Causa Nossa e só os itálicos que coloquei são meus, como era explícito, precisamente para mostrar que o texto de VM dava a ideia errada de que ECT se tinha desmentido. Era necessário ler o texto ligado a esse no Causa Nossa para perceber que VM queria um desmentido do gabinete do Primeiro-ministro (PM) e que este o tinha então feito. VM aproveitou para fazer uma citação "malandra", dando a ideia de que ECT se tinha retractado, e ignorou obviamente que o desmentido do PM já ocorrera (o Bloguítica já o tinha informado). Terá provavelmente mais novidades desse lado quando a ERC ouvir proximamente Pedro Lourtie.
Como já afirmei aqui, VM tem sido deselegante neste caso com as suas insinuações (primeiro texto) e prosseguiu na mesma linha na citação de domingo ("portanto, houve desmentido").

Tal como João Paulo Meneses, não considero isto um desmentido de ECT. Pelo contrário, o crítico aproveitou a sua crónica seguinte para referir que tinha sido contactado pelo gabinete do PM e que este lhe dissera que as informações das fontes eram "totalmente falsas" (algo que um assessor de imprensa do PM já havia feito: "Nunca este gabinete interferiu na linha editorial de qualquer meio de comunicação social."). É uma informação ao público, que ECT dá de forma seca sem qualquer comentário. Um direito de resposta, se se quiser, em que o jornalista-crítico não quer ter a última palavra.
Essa foi dita hoje ("Mantenho o que escrevi") e deverá prosseguir em tribunal.
Esse era o primeiro ponto do meu texto anterior: se ECT não justificar o que disse de forma tão categórica - "as informações de que disponho indicam que o gabinete do primeiro-ministro deu instruções directas à RTP para se fazer censura à cobertura dos incêndios: são ordens directas do gabinete de Sócrates." - descredibiliza-se (mesmo na sua condição de jornalista, com as condicionantes de ter misturado informação factual e opinião). Mas, se revelar a(s) fonte(s), quem perde é o jornalismo. Resta o quê? "Ficar assim não tem jeito nenhum, ou melhor, fica a parecer que não sabe quem fala verdade. Será o caso?
A ser assim, ao não expor sequer se é esta a dúvida que agora regista, mais valia ter ficado calado relativamente às acusações que fez.
"
Para quem se lembra do caso Marcelo/TVI, foi exactamente o que aconteceu: as pressões sobre o crítico-comentador foram individualizadas com consequências.

O segundo ponto, da validação de um Telejornal como exemplo dessa interferência, tem tido outras evoluções: como Luís Marinho denunciou, o próprio Público no dia 13 de Agosto deu pouca importância ao que ECT salienta no referido Telejornal de dia 12 e só o fez a 20 (foi um erro, assumiu o Público). A questão é saber se o alinhamento de outros (tele)jornais foi semelhante (Marinho não tinha de o demonstrar, claro). [act.: mais sobre o assunto nesta "Oportunidade perdida"]

Tudo isto continuou com o normal nestes casos, não se ataca o texto mas o homem:
1) o Clube de Jornalistas analisou o último "comentário" de ECT e descobriu que havia algo semelhante na Internet mas não o acusa de plágio
[act.: ECT já esclareceu o CJ; act.1: a ler os comentários; act.2: filhos da mãe; act.3: o CJ apresenta uma "Nota do Coordenador" que não é apenas dirigida a ECT "mas que pode, de algum modo, esclarecer essas mesmas almas [inquietas, ou mal intencionadas, ou simplesmente imbecis, que entenderam pronunciar-se sobre este assunto] ou outras que, porventura, deambulem por aí, expiando as suas (deles, entenda-se) culpas.];

2) Pedro Rolo Duarte, na mesma lógica de VM, atira-se ao "jornalismo 'vale tudo'" ("A virtude desta espécie de jornalismo é a impunidade: qualquer um pode escrever o que quer debaixo do chapéu das "fontes", ou da liberdade de opinião, conforme a conveniência. ECT sabe como funciona a comunicação: lançada a atoarda, fica o carimbo colado a quem ele critica, e depois quem está mal que se queixe. A justiça não funciona e a memória dos homens é curta. Ele conta com isso.") e alguma tradição quando não se gosta de ECT: é um vendedor de parabólicas...

No entanto, as críticas de ECT têm atravessado os governos socialistas e sociais-democratas, trabalhou para a RTP ou para a reformulação do serviço público. Critica todos, na RTP como na SIC ou TVI. Este episódio só veio chamar a atenção para o que se anda a passar nas televisões, em especial na RTP1, como hoje Vasco Graça Moura sintetiza (negrito meu): "Eduardo Cintra Torres falou no acatamento pela RTP1 das instruções do Governo no tocante aos incêndios e na minimização das notícias correspondentes, quer em tempo de duração, quer no alinhamento dos serviços noticiosos. A RTP1 reagiu à insinuação, mui ciosa da sua independência jornalística. E assim, enquanto não se procede à comparação com os dados resultantes dos telejornais dos anos anteriores, também a propósito dos incêndios não há razão para sobressaltos.
A RTP1 decerto virá a proclamar com legítimo orgulho que não foi por obediência ao Governo que consagrou, na quinta-feira passada, os 16 primeiros minutos do Telejornal das 20.00 às dimensões transcendentais do caso Mantorras. De facto, nem o próprio Governo se lembraria disso, por muitas veleidades de interferência que tenha. E afinal esses 16 minutos não podem mudar o mundo. Só podem dar uma ideia daquilo que a RTP1 entende por serviço público de televisão."
Em resumo, é mais fácil disparar contra o crítico.
(Já agora, o que é dito sobre a RTP também é válido para a Lusa? É que a agência continua a omitir nos seus textos (nos que leio online) que as críticas de ECT foram feitas expressamente ao gabinete do PM e não apenas à RTP. Hoje generaliza e fala nas "pressões governamentais"...)